domingo, 7 de fevereiro de 2010

...Riso do Mar...


estou na praia, vejo o mar. olho pra ele e ele pra mim. e ri, com seus dentes brancos espumantes numa constante galhofa que não quer cessar.


- me parece feliz, lhe digo. da última vez que nos vimos estavas soturno, introspectivo; eras mar com alma de lagoa.
- tenho lá meus humores, me diz assim, na lata.


e me dou conta que há bem pouco tempo nos havíamos encontrado, esse mar de "bela e santa catarina" e eu. pra ticamente só nós dois, num outro amanhecer qualquer, enquanto muitos dormiam e de olhos abertos, na pós madrugada, frente a frente nos contemplávamos.


- rio porque sou mar, me diz. e eu respondo: mar não ri. tu és mar, não rio. sei que tens boca, esôfago e estômago já que tragaste a muitos e a tantos outros embalsamaste aprisionando-os na tua tumba salina. simplesmente mar não ri, chora. e quando está contente, chora de alegria porque mar é uma imensa lágrima salgada quase infinita que existe pra chorar. e ele indiferente ri, olhando pra mim, e eu pra ele. com aqueles dentes brancos espumantes que não cessam de gargalhar.
- tu não sabes nada de mar pois és gente. gente que ri e que chora e de quando em vez derrama umas poucas lágrimas de sal.
- ris de que? pergunto eu. - de mim ou para mim?
- nem de ti, nem para ti, infeliz. rio da vida, me responde.
- da vida coisa nenhuma, incomodado retruco. tu és mar, saber pouco da vida. e se realmente soubesses então sim, talvez ririas. tu sabes mais de morte que de vida já que em tuas entranhas jazem sepultadas embarcações, marujos e toda sorte de gente.
- já vi que não sabes nada, me diz. sou mais da vida que da morte. em mim existe abundância de vida; são algas, são peixes, são seres aos milhares que vivem de mim, vivem em mim, vivem pra mim. isso que é vida! vocês, que são gente é que são de morte pois vem ao meu encontro para ceifar vidas. e não parecendo satisfeitos, mais tarde, divertem-se com maus cadáveres. se põem a atacá-los de garfo e faca em cima de suas mesas, na arena de seus pratos. e ainda por cima riem!
- eu sim, sou da vida, e é por isso que você vem ao meu encontro no começo da luz do dia pra engolir minha beleza, e com os olhos se encher de vida. sou da vida, da alegria pergunte às crianças que de mim se deliciam, e nas minhas praias se divertem construindo castelos de areia!


- aha, agora te peguei! da vida coisa nenhuma; tu és de morte, sorrateiro e vingativo, pois quando menos se vê, vens e destróis os castelos, as muralhas, os sonhos de qualquer criança, de qualquer pessoa, impiedosamente.
- e a vida não é assim, por acaso? me diz? um constante erguer, desmanchar e reerguer de castelos, planos e sonhos? constantemente? assim é a vida, assim é o mar, e ri esbaforido.


reflito, penso e rio. agora rio eu, tanto que não me aguento. que de um instante pra outro consigo entender que o mar chora e ri quase ao mesmo tempo. é da morte e é da vida, mais da vida que da morte. é igual a gente, assim, criatura. e rio tanto que me dói o estômago, de tanto rir e me encharco de lágrimas, salgadas, como o mar. e passo a desejar a todos que me amam e a todos quantos amo, simplesmente, a vida, o mar. e àqueles que desafortunadamente não tem mar, apenas rio.




Autor:Jader Santos